Se fosses só tu (sem o logotipo), o que ficava?
Quanto mais longe chegamos, mais nos confundimos com aquilo que representamos.
Esta não é uma pergunta que costumo fazer em voz alta.
Mas é uma daquelas que carrego comigo nas entrelinhas, cada vez que entro numa sala com alguém como tu.
Porque há uma espécie de paradoxo silencioso que reina:
quanto mais longe chegamos, mais nos confundimos com aquilo que representamos.
Há uma altura em que já não sabemos muito bem se o que as pessoas admiram é a nossa visão, ou o nome que temos na porta.
Se nos ouvem pela clareza com que falamos; ou porque somos o CEO de algo que elas reconhecem.
Quando te apresentas, o que vem primeiro: o teu nome… ou a tua função?
E se um dia deixasses esse papel, o que sobrava de ti no mundo?
Esta carta é para esse espaço íntimo, nu, sem filtros. Onde a identidade já não se consegue esconder atrás do cartão de visita.
Eu sei que, por trás da tua presença impecável, há perguntas que tens adiado há anos:
Quem sou eu para além disto tudo?
Existe uma voz minha, que não é institucional?
Se amanhã desaparecesse o título, desaparecia eu também?
O que construíste é gigante. É admirável. Mas talvez já não te contenha.
A tua opinião continua a moldar decisões.
O teu carisma continua a abrir salas.
Mas há dias em que sentes: não sou eu que estou a ser ouvido - é o meu cargo.
E com isso, cresce um medo subtil. Não aquele medo óbvio, de falhar ou perder…
Mas um medo mais profundo:
o de nunca teres tido o teu próprio espaço.
Pode parecer absurdo, até ingrato, pensar nisto.
Afinal, és respeitado. Influente. O teu nome tem peso.
Mas o que descobri - nos bastidores dos bastidores - é que os líderes mais extraordinários que conheço carregam todos uma ferida semelhante:
a dúvida se a sua presença terá valor, quando já não vier acompanhada de um cargo.
E então, a pergunta volta:
Se fosses só tu, sem o logotipo, o que ficava?
E eu digo-te!
A tua história.
A tua voz.
A tua clareza.
O impacto que nunca dependeu de estrutura, nem do palco. Aquele que fazes, sem nunca mexer um braço.
É aí que começa o próximo ciclo:
quando deixas de te proteger com títulos e passas a liderar a partir de um lugar que ninguém te pode tirar.
Quando o que te sustenta já não é o estatuto, mas a tua essência.
Quando já não precisas de te apresentar.
Porque a tua presença fala por ti.
Rita Sambado
Legacy Leadership Advisor